PUREZA - Ruy Alves (1965)
A noite caía, assim como caem as noites frias de inverno. Sim, de inverno, porque no Brasil há muitas noites frias, inclusive no inverno... Mas, apesar de tudo isto e aquilo, a noite caía lenta, leve, opaca, misteriosa e escondida. O inverno se cobre de noite sem aquela possibilidade de vermos as coisas lá longe. O homem não pode ver longe as coisas e até a vida... Haja vista que a vida no inverno, é em reduto fechado. As ruas são mortas, o ar é triste. Aliás, não há nada mais triste que uma noite fria...
Mas a noite vinha, ou melhor, já era noite de temperatura baixa. Eu nela e igual a ela, até certo ponto... Isto é, triste e só. Sim, a noite fria é muito só... não tem estrelas, não tem gente solta por aí, está tudo como que guardado para a primavera e para o verão. E eu vinha com frio na rua deserta quando ela, bela e de braços cruzados assim como todo mundo cruza quando está com frio. Ela, de braços bonitos, comprimindo seus lindos e sensuais... movimentos respiratórios... Ela, com o corpo das quatro estações ia pela rua fria, com tudo que Deus tão prodigamente lhe deu... Eu pensei, olhei e vi que apesar de tudo era uma mulher que não olhou para meu carro e ainda tirou o braço direito de cima do peito e se benzeu. Cruzamo-nos à frente de uma igreja. A noite era fria, eu pecava pensando e ela nem em pensamento...
Ela ia indiscutivelmente só. Só até em pensamento!...
OLHOS - Lua Barreto (2006)
Descia a rua
E levava comigo seus olhos
Olhos frios como uma noite de inverno.
Não ia só.
O frio azul de seus olhos
Seguia comigo.
Pena...
Trouxesse comigo um sorriso
Em lugar dos olhos
E seria verão em meu peito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário